
Mesmo recolhido na Superintendência da Polícia Federal em Brasília, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) segue reproduzindo um comportamento que marcou sua trajetória política: a desconfiança generalizada de que poderia ser vítima de envenenamento. Desde o final da semana passada, três aliados considerados de “confiança absoluta” pela defesa foram autorizados a levar comida diretamente ao ex-presidente, medida que, segundo familiares, busca evitar riscos ligados ao trajeto ou ao manuseio dos alimentos.
A justificativa foi reforçada pelo senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que afirmou não se tratar de suspeita direta sobre os agentes da PF, mas de receio sobre as etapas pelas quais a comida passa até chegar ao pai. A postura, entretanto, não causa surpresa a pessoas próximas ao ex-presidente, que relatam que o medo de adulteração acompanha Bolsonaro há décadas.
No período em que ocupou o Planalto, Bolsonaro passou a viajar com caixas de garrafas de água lacradas e previamente separadas por assessores, inclusive em deslocamentos internacionais. Em eventos oficiais, entrevistas e debates, recusava-se a consumir bebidas que não estivessem sob seu controle. Em Nova York, malas eram reservadas apenas para transportar água brasileira considerada “segura”.
O comportamento também apareceu em episódios recentes. Durante o interrogatório no Supremo Tribunal Federal, que antecedeu sua condenação e prisão, Bolsonaro ficou horas sem aceitar os copos d’água oferecidos aos presentes na sessão. Mesmo uma garrafa fechada, entregue pela segurança do tribunal, acabou rejeitada, restando a aliados consumirem o conteúdo no lugar dele.
Agora detido, Bolsonaro continua sob vigilância permanente, em um ambiente que, em tese, oferece poucas variáveis fora de controle. Ainda assim, mantém o entendimento de que qualquer etapa do preparo ou transporte de alimentos pode representar uma possibilidade de risco. O padrão de cautela se tornou, ao longo dos anos, uma rotina operacional que interfere no cotidiano das equipes ao redor do ex-presidente.
A origem desse temor nunca foi confirmada. Pessoas próximas citam relatos que Bolsonaro ouviu ao longo da carreira sobre episódios da ditadura militar, além do impacto da facada de 2018, que teria aprofundado sua percepção de vulnerabilidade. Independentemente das causas, a postura se consolidou como parte de seu comportamento público e privado — e agora segue influenciando a rotina da PF, responsável por custodiar o mais desconfiado de seus detentos.
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