Representantes das comunidades de Suzana e Campinho, localizadas na Serra da Moeda, em Brumadinho (Região Metropolitana de Belo Horizonte), e de ONGs de defesa do meio ambiente local denunciaram a deputados que a fábrica da Coca-Cola, instalada na região desde 2015, está secando as nascentes e prejudicando o abastecimento de água.
O debate sobre o tema foi feito nesta quinta-feira (7/12/17) pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e contou com a presença do Ministério Público, Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam) e das Prefeituras de Brumadinho e Itabirito (Região Central).
O presidente da Associação dos Moradores da comunidade de Suzana, Warley Pereira do Nascimento, lamentou que a região, que sempre foi privilegiada por sua oferta de água, hoje sofre com a carência do recurso. Ele disse que estudos geológicos feitos pela empresa não garantem que a fábrica não impacta os recursos hídricos.
“A comunidade está sofrendo com a falta de água. As mais de mil famílias que vivem ali estão sendo abastecidas há um ano e meio por caminhões-pipa enviados pela própria Coca-Cola. Entendo que as outorgas e liberações feitas pela Prefeitura de Itabirito foram equivocadas”, salientou.
Da mesma forma, o representante da Associação de Captação de Água da Serra da Moeda, Jorge Celes de Farias, afirmou que, desde a chegada da empresa, as nascentes estão secando. Ele pediu, então, que sejam tomadas medidas para a preservação do meio ambiente local, já que a exploração da água pela empresa estaria prejudicando moradores e animais.
O vereador de Belo Horizonte e morador da região, Gilson Reis, acrescentou que a fábrica consome milhões de litros de água e está afetando diretamente as comunidades e a sustentabilidade local. Para ele, as informações sobre a outorga para exploração da água pela Coca-Cola estão truncadas e devem ser melhor apuradas. “O fato é que a água vem acabando desde 2015”, alertou.
Estudo feito por ONG aponta rebaixamento das nascentes
Segundo Ronald, foi detectado rebaixamento do volume das nascentes após dois meses de operação da empresa – Foto: Guilherme Bergamini
O geólogo da ONG Abrace a Serra da Moeda, Ronald Fleisher, apresentou uma pesquisa técnica feita por ele, que aponta como está sendo feita a exploração pela Coca-Cola das nascentes de Suzana e Campinho.
De acordo com ele, após dois meses de operação da empresa, já havia sido detectado rebaixamento do volume das nascentes. Isso porque o consumo médio de água utilizado para a produção representa o equivalente a 120% do que a população de Brumadinho faz uso por mês.
“A outorga concede o uso de três poços e a Coca-Cola se eximiu de avaliar os impactos ambientais desse uso, assim como monitorar e quantificar o impacto da exploração do aquífero com uma vazão tão grande”, lamentou.
Ronald explica que as entidades da região denunciaram ao Ministério Público Estadual o fato e cobraram o cumprimento pela empresa das condicionantes ambientais. Ele disse que, neste ano, a Coca-Cola apresentou um relatório preliminar, segundo o qual o rebaixamento da nascente é causado pela falta de chuva, a exploração dos poços não afeta seu volume e há uma grande disponibilidade hídrica para o atendimento à fábrica.
“Questionamos esse relatório, uma vez que o reflexo da escassez de chuva não seca as nascentes em curto prazo e que as reservas de água foram superestimadas. Até mesmo o Instituto de Pesquisas Tecnológica apontou que o relatório é inconclusivo no que se refere ao impacto da exploração das nascentes da região”, pontuou.
Fiscalização falha – A advogada da Prefeitura de Brumadinho, Beatriz Vignolo, reforçou que não foi feito estudo de impacto ambiental para a instalação da fábrica, o que mostra uma flagrante irregularidade na concessão da outorga. Para ela, os órgãos estaduais de fiscalização estão sendo omissos.
Ela alertou, também, que a Serra da Moeda é divisora de águas e de municípios e que o aquífero impactado serve de recarga para as nascentes responsáveis por parte do abastecimento de toda Região Metropolitana de Belo Horizonte.
Prefeitura de Itabirito garante sustentabilidade hídrica
Eduardo garantiu que a concessão atende todo o abastecimento do município – Foto: Guilherme Bergamini
Em resposta aos questionamentos dos moradores, o assessor Jurídico do Serviço Autônomo de Saneamento Básico (SAAE) de Itabirito, responsável pela outorga para o uso da água pela Coca-Cola, Eduardo Albuquerque, garantiu que a concessão atende todo o abastecimento público do município e não apenas a fábrica.
Segundo ele, o volume hídrico autorizado para exploração contempla todos os moradores e existem estudos científicos e técnicos que comprovam a sustentabilidade hídrica. “O trabalho não é feito para rebaixar o lençol freático e o empreendimento seguiu todas as normas técnicas necessárias”, destacou.
O representante da SAAE disse, ainda, que não há evidência técnica que comprove que foi a Coca-Cola que reduziu o volume das nascentes e que o órgão possui os estudos que foram solicitados pelas entidades de fiscalização.
Monitoramento estadual – A analista ambiental do Igam, Maricene Paixão, lembrou que o instituto foi convocado quando da emissão da outorga pela Prefeitura de Itabirito para uso o da água pela Coca-Cola. A partir disso, segundo ela, o órgão vem acompanhando o processo. Ela reconheceu que não foi feito um estudo de disponibilidade subterrânea neste caso e que o monitoramento do Estado é mesmo precário.
“É preciso ser implantado um sistema de fiscalização mais eficiente, mas estamos produzindo estudos. Se eles comprovarem que a fábrica está afetando as nascentes, medidas legais serão tomadas. O resultado deste trabalho sairá em breve”, prometeu.
Ministério Público quer respostas em até 10 dias
O promotor de justiça Francisco Chaves Generoso lembrou aos deputados e moradores das comunidades de Suzana e Campinho que o MP solicitou a realização de estudos e laudos técnicos à Coca-Cola, mas que os resultados foram inconclusivos.
Diante disso, já teria solicitado à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), que é responsável pela concessão de licenciamentos ambientais no Estado, que, em um prazo de 10 dias, sejam dadas respostas objetivas sobre os reais impactos do empreendimento na região e como está sendo feito o monitoramento.
Encaminhamentos – Ao final, o deputado Geraldo Pimenta (PCdoB) defendeu que a melhor forma de reverter a situação passa pela mobilização dos moradores e representantes do poder público. Além disso, pediu a revisão do licenciamento ambiental concedido à Coca-Cola.
O autor do requerimento para a audiência, deputado André Quintão (PT), disse ter ficado claro que o processo de outorga não contemplou um estudo aprofundado de impacto e viabilidade hídrica. Para tanto, anunciou que a comissão vai preparar requerimentos com pedidos de providência sobre o fato, entre eles de uma visita à Semad para ter acesso aos documento da outorga e licenciamento para a exploração de água na Serra da Moeda.
Agência de Minas Gerais